quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Over restoration: alguns carros de concursos de elegância podem ser mais customizados do que fazem entender (Primeira Parte)


Quando pensamos em automóveis clássicos de extrema elite – especialmente os das décadas de 20 a 40 – que vencem premiações do tipo Best in Class em concursos de elegância, é quase inevitável pensarmos em automóveis com pinturas lisas como um espelho, com zero textura de casca de laranja, gaps de portas e capô zerados como um Bentley Continental GT 2018, assoalho brilhando como a parte de cima da carroceria, cada parafuso polido e interior absolutamente perfeito em cada poro. É um nível de perfeição tal que, somado ao design atemporal destes veículos, o resultado é uma presença divina, como um monolito de 2001 na forma de um automóvel.
Fotos de época dos Talbot Lago do fim da década de 30 mostram carros maravilhosos, mas um pouco mais mundanos em termos de brilho e vãos e recessos de carroceria nas junções com acabamentos do que os que vemos na fotos de carros de Pebble Beach. Esse tipo de restauração envolve um pelotão de profissionais de extrema qualificação e frequentemente eleva o automóvel para uma condição técnica e de luxo melhor do que a que ele foi quando saiu zero quilômetro da fábrica ou do coach builder. Este estado é chamado entre os colecionadores como “mint” ou “better than new”.
A belíssima cabine deste Bizzarrini 5300 GT é o típico caso de over restoration: chamada de “restauração concours” pelo dono, traz um luxo que nunca existiu nas cabines originais. Sua execução está infinitamente superior, com materiais e técnicas muito melhores. Além disso, o console central foi modificado ao gosto do dono, apesar da cara de época. Um interior maravilhoso, mas que não pode ser chamado de original quanto menos de restauração concours Mas há um outro nome menos bonito que tem sido empregado cada vez mais com quem está preocupado com a distorção histórica que está sendo criada com esta bela obsessão: “over restoration”, que podemos entender como restauração excessiva. A estes, embora sejam fascinantes aos olhos, boa parte dos vencedores de concursos de elegância são veículos reimagined, pertencentes a uma realidade paralela mistificada e fantasiosa, ficando muito mais próximos de uma customização que da coerência histórica.
Cabine original de um Bizzarrini 5300 GT: bem menos cativante, mas historicamente coerente. A preocupação deste grupo não é nada ilegítima: nos últimos anos, muitos exemplares únicos valiosíssimos e íntegros foram completamente desmontados e refeitos do zero para se atingir uma perfeição estética conceitual, despindo-os de toda a substância de época em nome de uma premiação num concurso de elegância – mas estes, em tese, deveriam valorizar acima de tudo a preservação histórica, pois caso contrário, seria uma espécie de SEMA Show da placa preta.
E não é que isso aconteceu muitas vezes? Assumiu-se processos fascinantes do ponto de vista técnico, mas o resultado são carros perfeitos demais para serem historicamente coerentes, para não falar das discretas adições de luxo que são feitas em muitos veículos presentes nestes concursos: dobradiças cromadas no lugar de pintadas, assoalhos e cofres de motor polidos, caixas de diferencial com rugosidade eliminadas, elementos banhados ou polidos em vez de crus, arremates de couro adicionais, couro de primeiríssima linhagem no lugar de tecido, madeiras mais nobres, vernizes ou elementos de marchetaria no painel onde não havia, tapetes e carpetes mais caprichados e rebuscados. São elementos difíceis de serem identificados pelos juízes até pelo volume de carros a serem avaliados in spot sem material imagético de época disponível em mãos, mas que todos juntos, dão aquela aura divina e quase sobrenatural ao veículo. Fonte: www.flatout.com.br

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